quarta-feira, 22 de abril de 2015

Ditadura da Felicidade

Acabo de ver alguns comentários criticando o baixo astral de pessoas com HIV. Falando que deveríamos simplesmente ver lado positivo da vida e seguir em frente sem nos abater. Respondi que adoraria ter um botão do otimismo e bom astral. Resolveria muitos problemas, na verdade, acho que resolveria o problema do mundo. Por que algumas pessoas conseguem ser felizes e outras não? Por que a tristeza do outro incomoda tanto? E por que não podemos nos permitir sofrer?



Não há respostas definitivas para essas questões. A humanidade de forma geral luta para responder essas questões de forma satisfatória. E com todo o conhecimento acumulado em áreas tão distintas como a neurologia, psicologia ou filosofia, apenas arranhamos alguma explicação. Intuitivamente, temos a sensação de não ser justo sofrer, ser triste ou deprimido. Queremos que todos tenham dias radiantes e de satisfação. Mas a verdade é que não importa o avanço tecnológico ou médico, pessoas deprimidas, melancólicas ou só "pra baixo" continuam a surgir no mundo. Alguns com certa sorte conseguem se tratar e lidar com sua condição outras vão até o fim lutando com algo que é tão delas como a cor dos olhos ou facilidade de escrever com a mão esquerda. Nossa diversidade humana externa também é refletida na interna. E só somos o que somos, pois somos assim. Grandes artistas e cientistas só se tornaram grandes pois eram diferente dos demais. Muitos eram depressivos, malucos, deslocados no mundo social... Mas como quem manda no mundo é a maioria, e a maioria é formada por pessoas ajustadas à realidade, aqueles que são diferentes acabam por se sentir pressionados a entrar na normalidade. Atualmente, vivemos a ditadura da felicidade. Temos que ser felizes e parecer felizes. Veja o Facebook, veja as revistas de celebridades. Nem sempre foi assim, já vivemos períodos em que a felicidade demonstrada de maneira efusiva era coisa de pessoas pouco educadas, como em momentos de guerra, por exemplo. Ou momentos que a melancolia era mais charmosa que a felicidade, qualquer estudante que completou o ensino secundário já ouviu falar do romantismo, com seus poetas da infelicidade. Nosso período atual é o da alegria maníaca, da alegria agressiva. Temos que ser felizes de qualquer maneira, e o infeliz é um perdedor. Isso é tão disseminado na sociedade que temos como certeza absoluta. Alguém imagina que alguém pode ter felicidade sendo triste? Não estou falando que todos não devemos ter o direito de ser felizes, mas sim que existe uma diferença entre felicidade, alegria e tristeza. Que se permitir ser infeliz em alguns momentos é mais do que saudável, mas também necessário. Que podemos entender a felicidade como um equilíbrio na nossa existência, que nos permite ser quem somos, mesmo que fujamos da norma. Conviver o mais alegre com o mais tristonho, e entender que é o contraste dessas duas formas de ver o mundo que nos fazem criar uma vida feliz. E que um estado não é sentença na vida. Que podemos oscilar entre o positivo e o negativo da forma que seja possível. Eu francamente acredito que todos nascermos para sermos felizes, mas sei que a ideia de felicidade que existe predominantemente no mundo atual é uma ilusão. E que querer impor a nossa forma de ser feliz sobre a forma do outro ser é causar sofrimento desnecessário. Nada contra quem queira mudar, quem queira se tratar ou quem queira o prazer a qualquer preço, mas muito do sofrimento do mundo vem do fato de achar que deveríamos ser o que não somos, ou que deveriam ser o que não são... Vale a reflexão:


Nenhum comentário:

Postar um comentário