quinta-feira, 28 de abril de 2016

Tic Tac... Tic Tac... Ou meia década.

Coloque mais 5 anos na sua idade. Se você tem 20, tem na verdade 25. Se você tem 40, tem na verdade 45. Assim funciona para o portador do HIV em tratamento com os antirretrovirais.
Em pesquisa recentemente divulgada o portador de HIV tem idade biológica acrescentada em 5 anos. Acho que a grande maioria das pessoas que conheci e estão em tratamento podem confirmar esse estudo em sua percepção subjetiva. O impacto dos primeiro meses é tamanho que você entende que seu corpo e vitalidade não são mais o mesmo. Seu rosto e corpo parecem acompanhar um ritmo diferente de envelhecimento também. As rugas, os cabelos brancos, a flacidez, as manchas e todos os sinais de envelhecimento aparecem mais frequentemente. Que pena que não ganhamos a cinco anos de sabedoria no processo, seria uma boa compensação. Na verdade, o impacto com nossa mortalidade e vulnerabilidade força um amadurecimento precoce também. Mas não é para todo mundo. E pelo número de adolescente tardios, de tiozões "pagando de garotinho", de senhoras plastificadas tentando ser mais novas que suas filhas e toda sorte de gente que se recusa a viver sua própria idade, talvez nosso envelhecimento precoce também tenham reflexos em uma personalidade mais madura, sim. Não estou dizendo que os senhores devam jogar dominó na praça e as senhoras devam fazer um tricô legal, mas a busca pela juventude eterna não faz bem para ninguém. Vivemos querendo parecer em vez de ser.
De qualquer modo, essa descoberta pode ser um incentivo para que procuremos mais saúde e qualidade de vida. Também é um convite sobre o significado mais profundo de nossa um pouco mais breve existência. Tenho cada vez mais pensado nisso e buscado também... Um sentido maior para tudo isso. Veremos.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

A saúde do portador de HIV

Em meio a surtos de Dengue, Zika e Chikungunya, surge o surto de H1N1. E você já possui HIV, se não possuir outras co-infeções. Tudo isso vai a gente pensar em cenários apocalípticos. Não se engane, os mais adaptados e mais fortes irão sobreviver, pelo menos mais. Então, você que tem uma saúde mais ou menos controlada, deve fazer um esforço ainda maior por você mesmo. 
Como disse no post anterior, somos velhinhos antecipados. Pulamos 10 a 20 anos a frente, para um momento que nossas saúde requer mais cuidados. Somos aqueles que tem prioridade nas filas e nas políticas de saúde. Somos aqueles que precisam encarar alguns fatos existências mais cedo. Afinal, ninguém sabe quando vai ter que lidar com complicações, mas nós esperamos por isso, como quem está para se esperar sabe que terá que lidar com o pós-operatório. O fato é mais sólido e concreto na nossa frente. 
Ainda me pego tendo aftas e outras dores estranhas. Me pego também mais cansado do que o normal e em momentos de tristeza mais frequentes. Tento me enganar que posso levar uma vida normal, mas qualquer porre, saída para uma festa ou mesmo o trabalho do dia a dia nos lembra que somos "especiais". 
As pessoas que convivo e tem HIV tem problemas parecidos. Em conjunto, somos como aqueles velhinhos de filmes que tentam cuidar um dos outros. Mas nem na velhice chegamos. 
A saúde do portador de HIV pode ser boa, mas não é ótima. Ou pode ser ótima, mas não é excelente. Quero dizer, por mais que você se trate e leve uma vida regrada, você está sim mais vulnerável a doenças e limitações. O quadro geral de um portador de HIV é de uma pessoas em envelhecimento precoce. Quer ver como você é e o que deve fazer para se cuidar, veja os mais velhos, com ou sem HIV. Veja o hábito de pílulas, exercícios e cuidados médicos e psicológicos. Mire nisso. É o melhor que pode fazer. Se tiver alguma fé, não deixe de cuidar desse aspecto, que pode ter impacto positivo no seu tratamento também. Um dia farei um post apenas sobre isso. 
Quanto mais cedo você aceitar sua nova situação e viver de acordo com seus novos limites, menos mal vai fazer para você e mais resultados vai colher. Ignore que você não é mais aquela pessoa de antes da doença e corra riscos, que podem ou não se concretizar. Mas para quer correr isso? 
É um conselho que eu mesmo preciso ouvir mais. E um conselho que deixo para você. 

Fazer menos mal aos outros e a si

Logo quando comecei a escrever esse blog lembro de ter falado sobre uma das coisas mais contraditoriamente positivas de ter HIV, aquela sombra da finitude que algumas pessoas vão descobrir tarde da vida se manifesta. A consciência que vamos "desaparecer" vem antecipadamente e devemos fazer certas escolhas.
A primeira reação é tentar cuida si melhor, levar uma vida mais saudável. O que requer uma dose grande de força de vontade e disciplina. Pergunte para qualquer pessoas, se ela está pronta para se salvar tendo abrir mão de certos hábitos e criar novos. A maioria vai dizer que sim. Outros tantos vão por o plano em prática. Poucos vão levar à risca. O fato é que o controle da doença engana. Faz que a gente se sinta quase normal e aos poucos volta a certos hábitos que são insustentáveis na nova vida.
A vida de um portador de HIV deve ser antes de mais nada regrada. Menos álcool, melhor alimentação, evitar fumo e substâncias nocivas. Você geralmente se torna um velhinho antecipado. tem tendências a algumas doenças, as consultas aos médicos e exames são mais frequentes e sua fisiologia não acompanha mais à das pessoas da sua idade. Você se vê pegando sobre o fim mais constantemente. E tudo isso tem um efeito longo e crucial em toda sua vida. Você não é mais o mesmo. E quanto mais rápido você aceitar isso, melhor para você e para aqueles a sua volta.
Se você se negar, a vida vai tratar de mandar seus recados. Uma inflamação aqui, outra ali. Uma dor aqui, outra ali. Um nova doença. Um novo sintoma. E por aí vai...
Estou chegando ao final do segundo ano de tratamento com bons resultados e com boa adesão. Tenho a sorte de ter a experiência de muitos que já estão nesse caminho a alguns anos. Tenho a sorte de viver em um mundo que a informação pode estar logo depois de um clique na internet. E olhe que já reclamei da falta de informação sistematizada. Mas não se engane, sou grato e tenho noção da sorte em relação a outros períodos e doenças que existem no mundo.
Mesmo assim, tudo ainda é duro e imprevisível. Fico vendo os meninos de hoje em dia que simplesmente fazer roleta russa com seus parceiros sexuais. Fico vendo aqueles que decidem partir para o viver agora como o último dia sem ver as consequências. E tento me enganar achando que não sou igual que também já não fui, sou ou serei assim. Mesmo que pontualmente. Mas o mundo está aí para garantir que a gente não tenha um vôo muito alto sem se descolar da realidade.
Hoje eu acordei assim. Pensando em quem já foi, em quem irá. Pensando em mim, e em tudo que passei para chegar até aqui. Não existe saída para nós. Talvez nunca existirá. Mas podemos ter algo que é tão precioso quanto importante e pode ser decisivo para que gente chegue pelo menos um pouco mais longe: uma consciência um pouco maior da frágil, ilógica e linda existência humana.