Uma coincidência me levou a
experimentar uma estranha série de situações no mínimo surpreendentes. Foi um
encontro com um conhecido em uma farmácia ao buscar minha dose de antirretrovirais.
Eu que não tenho revelado a minha condição para ninguém me peguei de frente com
uma pessoa relativamente próxima. Na verdade, mais do que isso. Uma pessoa por
quem já fui interessado no passado.
Não fazia ideia que ele era
soropositivo, mas pelo que ele falou, a minha condição talvez seja mais óbvia
do que eu tento guardar. Logo depois de uns constrangidos comprimentos e entre
olhadas ele me falou algo que me gelou:
_ Eu tinha certeza que você
tinha pegado.
A justificativa tinha sido
meu emagrecimento e sumiço. Ele disse que teve vontade de falar comigo, mas que
não sabia como eu iria recebe-lo. A conversa tomou um rumo amigável e
resolvemos esticar o encontro num restaurante não muito longe dali. Sentamos,
conversamos e começamos uma sessão de confidências mutuas. Que talvez se
tivesse pensado duas vezes não as teria feito com tanta abertura e sinceridade.
Lembramos da época que
saímos juntos. Sem que eu revelasse que naqueles dias tinha sentido algo muito
forte e imaturo por ele, e por isso tinha me afastado em certo momento. Ele
pareceu não ser consciente disso. E me descrevia como apenas mais um dos amigos
de uma época muito agitada de nossas vidas.
Ele me contou como contraiu
o vírus e, por ser um caso tão específico, não posso descrever aqui. Mas me
levou a deixar emocionado.
Até então parecia que uma
nova amizade nascia. E quem sabe o mundo de possibilidades que aquele encontro
poderia trazer para minha vida. Alguém próximo para trocar informações. Alguém
para pedir socorro nas horas de aflição. Foi então que a conversa tomou um rumo
estranho...
Ele começou a insinuar que
eu já sabia que ele era HIV positivo antes daquele encontro. Que ele tinha
certeza que todos sabiam. Todos nesse caso é um conjunto de amigos em comum.
Que não era para eu me importar e falar a verdade, que aquilo não importava
mais para ele. Quando eu neguei que suspeitasse dele. Ele se tornou um pouco
ríspido como se eu tivesse mentindo e se apressou a pedir a conta.
Eu não entendi o que estava
acontecendo. Parecia que tinha dito algo que contrariava o que eu mesmo falava.
Achei tudo muito estranho.
Nos levantamos e fomos até a
estação de metro. Ao nos despedir, ele ainda se manteve frio. E soltou um “até
a próxima”. Passei a catraca. Vim pelo
caminho pensando no que tinha se passado. Tentando lembrar o que eu fiz de
errado. Ou justificar o desencadear daquela atitude.
Fiquei chateado e não voltei
ao trabalho, não fui na academia e nem mesmo assisti televisão. Fiquei um tempo
olhando o perfil dele no Facebook tentando encontrar uma pista, um sinal,
qualquer coisa...
Tomei o remédio e fui
dormir. E acordo no meio da noite, agora, sem sono e com um pensamento que está
me incomodando. Por que fui confiar nele? Por que fui contar certas coisas?
Será que ele vai contar algo para alguém?
Por precaução, achei
prudente não escrever nada para ele agora, mas vou esperar até amanhã e vou
fazer contato. De qualquer maneira preciso tirar isso da cabeça. Vou torcer
para que tudo seja apenas um mal-entendido com uma explicação razoável.